terça-feira, 18 de setembro de 2012

Pretensão Psicanalitica sobre o filme Melancolia


 “ Meu amor

o que você faria

se só te restasse um dia

Se o mundo fosse acabar

Me diz o que você faria

Ia manter sua agenda, de almoço, hora, apatia, ou esperar os seus amigos, na sua sala vazia?(...)”

Paulinho Moska/Lenine

 

Se só restasse um dia, cada um reagiria de formas inimagináveis, mas não tão fora de acordo com o que se costuma agir diante de situações em que não se tem muita escolha, acredito. 

No filme de Lars Von Trier, a espera de seus habitantes para o fim do mundo, com a chegada do planeta Melancolia, nos dá um bom exemplo de que alguns, frente a falta de perspectivas,  recuam de sua via e adotam uma atitude fatalista frente ao conflito.Outros lutam até o fim.

Alguns fatores são estruturantes, porque traumáticos, no sentido de determinar uma estrutura (posição do sujeito em relação ao Outro). Lacan nominou de fantasma o que o sujeito inventa para arcar com a falta, um modo de negociar o objeto a (causa do desejo) em troca da demanda do outro. Os que recuam, não negociam. E os que não negociam...

Na trama, a personagem Justine sai de cena em seu próprio casamento. Vestida de noiva, resolve tirar o véu da fantasia. Incapaz de se iludir sobre o fim das coisas, desiste antes da hora. Desvestida da fantasia, que é o suporte do desejo, resgate de uma posição, torna-se desajustada, em desacordo, incapaz de corresponder a demanda do outro. A quebra da sua fé lhe tira condições para reinventar as representações do mundo, já que suas formações imaginárias (organização em torno de identificações e demandas de amor e reconhecimento) estão esvaziadas. A mãe-má recusa o pedido de socorro de Justine, se retira o tempo todo- se é que se colocou alguma vez- e o pai nem mesmo o escuta.

Freud inaugurou os estudos sobre os estados depressivos em seu artigo luto e melancolia (1917,1915). Diz que existem duas reações diante de uma perda real ou ideal de um objeto investido libidinalmente: o luto, uma condição normal, e seu correspondente patológico, a melancolia. O melancólico freudiano é o bebe repudiado pela mãe. E o lacaniano é seu outro materno pouco disponível, em que o Nome do Pai, foracluído, não se inscreveu por meio do discurso da mãe. Ao melancólico não houve significação fálica. O Outro não se apresentou em tempo ou se retirou cedo demais. Então o melancólico é aquele “preso a um tempo morto, um tempo em que o Outro deveria ter comparecido, mas não compareceu”, fala Rita Kehl. Morre o outro para o melancólico, morre o outro e portanto o próprio corpo.

            Diferente do luto, a libido investida no objeto perdido retorna ao eu e lá estabelece a identificação do eu com o objeto perdido. A perda não é simbolizada pelo melancólico, precipitando a morte do desejo. A comida preferida de Justine “tem gosto de cinzas” . “A vida na terra é má”. Parte do eu identificada ao objeto perdido se torna a própria perda em si. 
Em todo processo de luto, confronta-se com a castração.

Claire em contrapartida, cuida da irmã, mesmo depois da ruína de um casamento minuciosamente programado, e é ainda capaz de pensar num ritual simbólico ali, diante do inevitável.

            Finitude sim. Estamos diante do fim o tempo todo. O futuro é o tempo da incerteza, mas vale alguma criação de sentido frente a única certeza que temos, que é a morte. Todo dia é dia da possibilidade de nos restar um dia. E então?     

 

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