o que você faria
se só te restasse um dia
Se o mundo fosse acabar
Me diz o que você faria
Ia manter sua agenda, de almoço,
hora, apatia, ou esperar os seus amigos, na sua sala vazia?(...)”
Paulinho Moska/Lenine
Se só restasse
um dia, cada um reagiria de formas inimagináveis, mas não tão fora de acordo com o que
se costuma agir diante de situações em que não se tem muita escolha, acredito.
No filme de Lars
Von Trier, a espera de seus habitantes para o fim do mundo, com a chegada do
planeta Melancolia, nos dá um bom exemplo de que alguns, frente a falta de
perspectivas, recuam de sua via e adotam
uma atitude fatalista frente ao conflito.Outros lutam até o fim.
Alguns fatores
são estruturantes, porque traumáticos, no sentido de determinar uma estrutura
(posição do sujeito em relação ao Outro). Lacan nominou de
fantasma o que o sujeito inventa para arcar com a falta, um modo de negociar o
objeto a (causa do desejo) em troca da demanda do outro. Os que recuam, não
negociam. E os que não negociam...
Na trama, a
personagem Justine sai de cena em seu próprio casamento. Vestida de noiva,
resolve tirar o véu da fantasia. Incapaz de se iludir sobre o fim das coisas,
desiste antes da hora. Desvestida da fantasia, que é o suporte do desejo, resgate
de uma posição, torna-se desajustada, em desacordo, incapaz de corresponder a
demanda do outro. A quebra da sua fé lhe tira condições para reinventar as
representações do mundo, já que suas formações imaginárias (organização em
torno de identificações e demandas de amor e reconhecimento) estão esvaziadas.
A mãe-má recusa o pedido de socorro de Justine, se retira o tempo todo- se é
que se colocou alguma vez- e o pai nem mesmo o escuta.
Freud inaugurou
os estudos sobre os estados depressivos em seu artigo luto e melancolia
(1917,1915). Diz que existem duas reações diante de uma perda real ou ideal de
um objeto investido libidinalmente: o luto, uma condição normal, e seu
correspondente patológico, a melancolia. O melancólico freudiano é o bebe
repudiado pela mãe. E o lacaniano é seu outro materno pouco disponível, em que
o Nome do Pai, foracluído, não se inscreveu por meio do discurso da mãe. Ao
melancólico não houve significação fálica. O Outro não se apresentou em tempo
ou se retirou cedo demais. Então o melancólico é aquele “preso a um tempo morto,
um tempo em que o Outro deveria ter comparecido, mas não compareceu”, fala Rita
Kehl. Morre o outro para o melancólico, morre o outro e portanto o próprio
corpo.
Diferente
do luto, a libido investida no objeto perdido retorna ao eu e lá estabelece a
identificação do eu com o objeto perdido. A perda não é simbolizada pelo
melancólico, precipitando a morte do desejo. A comida preferida de Justine “tem
gosto de cinzas” . “A vida na terra é má”. Parte do eu
identificada ao objeto perdido se torna a própria perda em si.
Em todo processo de luto, confronta-se com a
castração.
Claire em
contrapartida, cuida da irmã, mesmo depois da ruína de um casamento minuciosamente
programado, e é ainda capaz de pensar num ritual simbólico ali, diante do
inevitável.
Finitude
sim. Estamos diante do fim o tempo todo. O futuro é o tempo da incerteza, mas vale alguma criação de sentido frente a única
certeza que temos, que é a morte. Todo dia é dia da possibilidade de nos restar um dia. E então?
Nenhum comentário:
Postar um comentário