Quanto às escolhas que nos rodeiam e nos angustiam diariamente, nada mais sensato do que coragem para carregá-las. Mas quantos agüentam o peso?!
Nietzsche em “O Anticristo” (1895), diz: “Fomos suficientemente corajosos, não poupamos nem a nós nem aos outros: mas por muito tempo não sabíamos aonde ir com nossa coragem. Tornamo-nos sombrios, éramos chamados de fatalistas. Nosso destino era a plenitude, a tensão, o represamento das forças. Tínhamos sede de energia e proezas, mantivemo-nos o mais afastado possível da alegria dos débeis, da “resignação”...Havia uma tempestade em nosso ar, a natureza, que somos nós, escureceu porque não tínhamos caminho. A fórmula da nossa felicidade: um sim, um não, uma linha reta, uma meta... ”. Fatalista, sábio, cético, louco. Da filosofia, sua arte, da lucidez, sua loucura, da desconstrução, uma visão que muito nos serve. Fez, foi e ficou na história porque acreditava nas suas convicções e no sentido que elas faziam, por mais que faltasse. Desacreditava na maioria das verdades universais, mas nunca dele mesmo. E por que não admirar essa coragem...E por que não ousar o desejo...
Decisões que adiamos, falas que contemos, a modernidade não sabendo escolher pois não sabe o que deseja. É o desejo que não é encarado porque pesa demais. Ficamos então emperrados nos próprios medos e a liberdade em relação a nós mesmos é traída pelas nossas próprias fugas. Evitamos a dor, adiamos o luto, nos escondemos atrás das nossas vontades, porque falta força, falta coragem. Quanto pesa saber de si e por que isso nos desencoraja?! Por quê o medo do peso e a preferência pela leveza? Em Insustentável Leveza do Ser(1984),de Milan Kundera, há uma questão que aqui nos cabe: “o que é positivo, o peso ou a leveza? Se o fardo mais pesado é, ao mesmo tempo, a imagem da mais intensa realização vital e quanto mais pesado mais nossa vida é real e verdadeira e, por outro lado, ser leve é distanciar da terra; os movimentos são tão livres quanto insignificantes.”
Que seja como pedra, ou como pluma, mas que haja coragem.
Querida Livia,
ResponderExcluirVocê acha que as escolhas que nos acompanham no dia-a-dia são, nas suas palavras, do tipo "pesada significante" ou do tipo "leve insignificante"? Será que no dia-a-dia costumamos nos problematizar a ponto de termos angústia?
Eu acho perfeita a colocação "...a modernidade não sabendo escolher pois não sabe o que deseja". Exatamente "é o desejo que não é encarado porque pesa demais". As consequentes fugas apontam para o avesso dessa sede pelo desejo, sua renúncia. Daí um contraponto: se a modernidade é caracterizada pela vitória dos afetos diante da tradição, pode-se entender que o desejo, tal qual o entendemos aqui, é sua cria. Mas diante de sua própria cria -o desejo moderno- o homem recua, se afasta da possibilidade de ser absolutamente livre para fazer o que bem entender de sua vida. Isso inclui viver vidas possíveis, desprender-se das origens, enfim, como se diz por aí "cada qual com seu próprio cada qual".
Enfim, gostei do texto, achei muito tocante a resposta dada à pergunta "o que é positivo, o peso ou a leveza?"; só acrescentaria que a leveza também pode ser conquistada por outra via, além da alienação de nossas marcas significantes. A leveza pode ser encontrada quando aprendemos, cada qual a sua forma, como lidar com nossos desejos, que, necessariamente, se relacionam com nosso lado "pesado, significante e real".
Um beijo.