“ Quanto ao amor, nada mais discordante. Basta que se esteja nele, basta amar, para ser presa dessa hiância, dessa discórdia” Lacan.
Pode parecer insuportável tolerar a incerteza que um amor traz. Não se trata jamais de completude, mas de ser capaz de suportar a duvida. Aceitar o amor tal como é, em sua estranha dor e alegria, na inquietação que enlouquece e cura, aprendendo com o outro, ensinando.
Essa crença tem perdido a força frente a uma cultura de imediatismo e relações descartáveis em que o amor é posto de lado. Mas amar é uma fé- é preciso acreditar para que ele esteja, e depois disso, saber estar. É ter que aceitar um outro e sua estranheza, acreditar sem exigência de certeza, tampouco garantia de validade. É um acordo de construção. Quando se fala em papéis de homem e mulher e se fala de amor, ganha quem quis saber do que se trata pra não perder tempo. É o homem a cabeça de uma relação. E a mulher o pescoço. Cabe a mulher entender das dores e perdas de cabeça e conduzir. Homens procuram certezas e se enroscam na incerteza que é uma mulher. E a mulher é o amor, capaz de entender do enrosco. Mas trata-se de uma aposta feita por uma coragem nem um pouco egoísta de deixar-se estar. Aí mesmo, nessa hiância, nessa discórdia. Do outro e suas dissonâncias. Obedecer ao amor, sem nele se anular, entendendo que haverá faltas mesmo diante de uma parceria respeitosa, habitadas uma pela outra, sustentadas uma pela outra. Nossos desejos são por vezes egoístas. E o egoísmo é uma força de renuncia diante da fragilidade de ser dois, limita-se a si mesmo, escolhe retirar-se a se dividir, não ter a conquistar, é a escolha frente a ameaça da possibilidade do difícil da entrega. É o contraponto que dói em cada um e que uns preferem não se haver. Como se fosse possível.
Transformar o amor louco em sensato sai fora da repetição covarde da desistência. Nada mais difícil do que saber aceitar, contrário a facilidade de uma paixão, nada mais difícil do que constituir um casal e um espaço de verdade, de confiança, de intimidade, de humor, de amor.
Amar é saber recomeçar. É reinvenção. É humildade que faz pulsar um sentimento nobre de que vida partilhada, é vida ganha.
Livia Lemos.
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