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No mercado atual, encontramos uma série de produtos desprovidos de sua propriedade maligna:
- creme de leite, sem gordura
-cerveja, sem álcool
- café, descafeinado
-sexo virtual, sexo sem sexo
Encontramos aqui, precisamente com a inversão de Lacan do famoso modelo de Dostoievsky: “Se Deus não existe, tudo está permitido” para “Se Deus não existe, tudo está proibido” Como? Por um lado, temos a autorização de ter uma vida cheia de felicidade e prazeres, mas, precisamente, no imperativo para ser feliz, há o "deverás evitar os excessos perigosos”.
Logo, ao final, tudo está proibido: não poderá comer gordura, tomar café cafeinado, cerveja com álcool. Nada é permitido fazer, precisamente sob o mandato do Gozar.
Então, o hedonismo contemporâneo combina prazer com constrangimento. Não é nada além da velha noção da medida correta entre prazer e coação. Gostas de sexo? Ok, mas não em demasiado, ache a medida certa, bla, bla bla; Não! É algo muito mais paradóxico, é uma espécie de imediata coincidência de dois extremos, como, se a ação e a reação coincidissem, o mesmo que causa dano já deve ser o contra-agente, o remédio. Um exemplo disso é o chocolate-laxante que traz em sua propaganda “tens prisão de ventre? Como mais deste chocolate!". A coisa já é seu contra-agente, e a prova negativa da calamidade disto, é o fato de que, hoje, o verdadeiro consumo não restringido em todas as suas principais formas: drogas, sexo livre, cigarro emergem como o principal perigo.
Como explicar o paradoxo no qual a ausência de Lei ("Deus está morto, tudo é permitido") universaliza a proibição?
Existe uma única explicação possível: o Gozo, mesmo que experenciado como transgressão é, em si mesmo, algo imposto. Quando gozamos, nunca o fazemos espontaneamente, seguimos um certo mandato. O nome psicanalítico para este mandato obsceno “Goza!” é SUPEREU.
A noção tradicional de psicanálise é que, devido a alguns obstáculos internalizados - a identidade excessiva com a proibição paterna, ou às proibições sociais (moral instituída)- não se poderia gozar livremente, o prazer não seria acessível, com excessão às formas patológicas, que produziriam a culpa, objeto de sofrimento.
Então, a ideia era que a psicanalise serviria de instrumento para a suspensão das inibições: vencer as proibições internalizadas para que se fizesse possível aceder ao gozo. O problema hoje, é que o mandato da ideologia dominante é de gozar de diferentes modos: poderá fazer sexo e gozá-lo, consumir mercadorias e gozá-las, gozar espiritualmente, realizando a ti mesmo qualquer coisa. O problema não é libertar-se das inibições e ser capaz de gozar espontaneamente, o problema é: como se libertar do imperativo ao gozo?
*Texto inspirado no documentário: "Žižek"